Espreguicei no silêncio, A alma repleta de sábado. Respirava fundo, Sentia o cheiro de luz. A madrugada, úmida, Tinha som de marolas E de grilos preguiçosos. Lá, extasiada, fui convertida À igreja do corpo E das memórias perdidas. Acharam-se, elas, numa lua escondida Num céu de nuvens-bálsamo Encoberto pela escuridão. Cresci um tanto de centímetros Nos sonhos. Hoje, eles alcançam O longe das planícies. Atravessam montanhas, Correm junto aos rios, E se metem a querer ser o oceano. Tão largos, sagrados e santos! Vez em quando fingem ser coqueiros E deixam suas folhas serenas balançarem Como se fossem os cabelos de Deus. Alonguei no horizonte. Estava escuro. Eu via tudo... A alma repleta!
Existe poesia na rotina? digam aí. eu só vejo poesia! ---- Toca o despertador. Acordo. Não entendo o que está acontecendo. Disparo o soneca do celular. Ontem dormi um pouco tarde. Foi inevitável. Senti o cheiro da pele e do cabelo, pé no pé, chuvinha lá fora, o calor do corpo dele do meu lado. Gozei e perdi o sono. Falamos da vida, tivemos idéias esquisitas, rimos muito disso. Ele dormiu, eu fiquei pensando em qualquer coisa, peguei um livro, Pessoa, Saramago, Tantra, Eram os Deuses Astronautas... tanto faz. Era um livro que eu gostava. Dormi. O soneca dispara a cada cinco minutos. Não consigo configurar pra dez. Levanto e vou fazer xixi. Vejo minhas olheiras no espelho. Vou ao quarto dar um beijo no rosto dele enquanto ainda dorme e fecho a porta. Nado, faço yoga. Volto. Fazemos café, vitamina com frutas, quinua, linhaça e leite de soja. A gente se beija, se abraça e come pão integral com manteiga. Vejo o que se passa na TV. Notícias de furacões, terremotos, maremotos, Mais Você,...
Ainda que me conheçam provável Isolada numa sala Sábia ou desinformada Tenho mesmo é olhos de poeta Quando chego a um novo sítio Ou percebo um sorriso que ainda Não havia percebido Tenho olhos de poeta se me percebo A amar os portos e as ilhas tanto quanto O caminho livre e apavorante do mar sem fim E quando exploro montanhas íngremes Em busca de nada mais que o silêncio em mim Assim também os tenho quando desejo uma casa Com a mesma louca intensidade que as estradas E se me deparo com o amor Nascendo na entressafra Quando vejo o que nunca antes tinha visto Minha poeta se torna criança Ou, por ser criança, é que assim vê Tenho olhos de poeta Quando reparo, que de repente, Acende em mim uma luz inesperada A todo instante acontece o improvável Apenas os poetas de alma - nem sempre os de palavra – Veneram sua chegada e o recebem Com flores e beijos na entrada Quem me conhece assim, tão calada Ou falando demais inúteis coisas É porque desconsidera a alma ...