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Mostrando postagens de julho, 2014

Pra que serve a poesia

se não servir a poesia para nada prefiro não ouvi-la não sou adepta do vazio da palavra que, aqui, uma vez dita, - a física garante - produz nota na cítara do outro lado do planeta que me sirva, a poesia! como me serve um prato de carne suculenta ou prefiro esquecê-la para quê poesia se não me lembra, ela, da vida latejante que existe para além do cansaço deve servir sim! para lembrar o absurdo risível que nada é tão absurdo que não possa ser possível

Humano, demasiado humano...

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Hoje, voltando para a casa, me peguei metafísica. Pensava na vida, como quem olha pra muito longe. E eu realmente olhava. Pela janela do metrô. De onde não se vê nada, a não ser dentro de si mesmo – um lugar longe... Por alguns instantes, fiquei tentando encaixar as peças de um nebuloso quebra-cabeças ao qual o meu desejo está profundamente vinculado. E esqueci que eu estava num vagão de metrô. Minha estação é a última e, às quase dez da noite, são poucos os que ficam para descer. Depois que o trem parou na penúltima estação, ficamos três naquele vagão. E, então, eu me vi de novo no mundo exterior. Lembrei haver um corpo que interage e que estava presente em um determinado lugar quando os meus dois companheiros de vagão me chamaram a atenção. Um homem e uma mulher, jovens como eu, caminhando ali pelos seus trinta e poucos anos. Sozinhos os dois, como eu estava. Ela chorava, com uma melancolia tão grande no rosto que chegou a partir meu coração. Olhava também para dentro, pois chorava

Aos nossos contadores de história que se foram...

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Ariano Suassuna, que nos deixou hoje, disse certa vez: "o homem nasceu para a imortalidade. A morte foi um acidente de percurso". Em poucos dias, a morte chegou para três grandes pensadores e escritores brasileiros: João Ubaldo Ribeiro, Rubem Alves e o próprio Suassuna. Tive a sorte de conhecer dois deles: João Ubaldo e Suassuna. E me deixar inspirar, como ser humano e como escritora. Talvez, seja mesmo a imortalidade que guie um criador a produzir sua obra. E não se trata de ego, mas de uma missão dada pelo universo. Desde o seu início, há alguns trilhões de anos, todo o universo conta a sua história e a mantém eterna. Meteoros carregam bactérias capazes de sobreviver por muito tempo, mais tempo do que nossa capacidade humana é capaz de imaginar. Cada semente conta a história da planta que lhe deu origem e da próxima que ela originará. Nós, seres humanos, contamos nossa história e nossas histórias de inúmeras maneiras: pela palavra, pela tecnologia, as ciências, as imagens,

Cheiro de rosa

um cheiro de rosa invade a minha sala se é incenso vindo de fora se é paixão que insiste no peito que importa fato é que um cheiro de rosa bate à minha porta e devaneio abro a garrafa de vinho escrevo mais um soneto enlouqueço e cedo à tentação de deixar escorrer pelo meu corpo um cheiro persistente que insiste em ser presente mas canso e me entorpeço desabo em direção a fonte do espasmo e me deixo exausta à mercê da tua estrada à guisa das tuas madrugadas sonhando contigo a me acordar em noites calmas delirando o abismo de desejar estar sempre em tua jornada estando vivendo contigo a construir realidades novas o que estamos fazendo senão traçando, juntos, uma estrada sinuosa? um cheiro de rosa invade a minha sala e sei que daí, a partir destes dias, pensas que não sabes mais o que sentir e eu... eu não sei apenas canto tua maravilhosa presença ensimesmando com tanta persistência

O amor tranquilo

então, era isso! de uma simplicidade estonteante! então era assim que, o tempo todo, ele estava programado para chegar? silencioso e sem querer no frio de uma madrugada de inverno depois da calma de um dia de sol que renovou a fé nos dias que virão então, era só isso? e eu não precisava ter sofrido tanto? mas, desconfio: o sofrimento é que nos traz o sentido da leveza e a sua grandeza então, o tempo todo, ele esteve comigo! porque nunca não haveria de estar eu apenas não o via mas, desde sempre, ele esteve respirando em meu ouvido então, era só isso... simples, fácil, óbvio e, por isso, belo como o sol descendo no horizonte ao som do bolero de Ravel

O substantivo vida

se perguntassem a um poeta o que é a vida carbono seria estrela vida é aquilo que existe quando a gente ama! e sente dor de estômago é o cheiro que enjoa e a luz que dificulta abrir os olhos é quando bate a saudade e nasce alegria de ouvir a voz querida é carinho desejado e acontecido vértebra cintilando o investido vida é dor dor nas vísceras é quando os músculos se contraem as lágrimas caem o peito se apavora vida tem gosto de vinho, azeite e amora e é a lida que começa cedo para fazer o pão é o moinho girando a água cantando na pedra o som da máquina do mundo o cabelo ao vento um poço bem fundo tem cheiro de delírio gosto de ser amado tato de mar salgado visão de deserto longo vida é o estilhaço das cordas renascidas e o sopro que anuncia o susto da morte às vezes, a vida parece uma falta de sorte e é um grande espanto no entanto, é a notícia dela, da sua chegada, a notícia da certeza de que sentir-se vivo é, antes de tudo, senti