Poema sensorial - ou da sensualidade universal
um
suspiro
e
eu derreto como relógio de dali
lentamente
vem chegando com o ar quente
cheiro
de musgo a tocar minhas narinas
como
se fosse a mais bela das criaturas da natureza
e
com que sensualidade a água bate na rocha
à
beira da praia
em
dia de profundo silêncio
esse
que toca dentro de mim uma melodia doce
e
um ritmo cruel
mesmo
lá onde homens e mulheres ainda não estiveram
lá
também o calor faz os corpos se tocarem
como
calor quântico e multidimensional
sem
o qual nem o cosmo nem a vida seriam possíveis
e
que empresta sua bossa à valsa vascular
trazida
ao ar pelo violoncelista
cujos
dedos tocam as cordas
como
se tocassem uma mulher de pele macia
brilhando
ao sol, em dia de brisa e verão
ela,
que com seus beijos não hesitaria em lançá-lo
àquele
prazer profundo
que
só as madrugadas permitem perceber
suave
e intenso, o óbvio do mundo
como
o odor do carvalho, o gosto do pão, o tanino da bebida
com
seus dedos a desenhá-lo parte a parte
a
deslizar sob as costas fortes e os cabelos densos
um
presente sem fim e sem início
tal
qual orvalho que, voluptuosamente,
escorrega
pela folha ao amanhecer
e
como bichos que são se amam ao sol
até
que a chuva venha refrescar-lhes os corpos saciados
que
poderão, então, se tornarem flor
brotar
da terra molhada como fungo
e
explodir em cor numa dança ao mistério do mundo
flor
pólen da abelha
flor
alimento do pássaro
que se deliciam e batem suas asas
para
fazer valer o vento
e
fazer valer a luz que a tudo penetra
essa
insaciável luz que se deita à noite com o infinito
para
gerar os filhos-estrelas, meteoros em colisão
choque
de corpos celestes
a
produzir o universo pelo tesão
lá
onde a lua atiça os lobos
que
uivam e copulam na floresta ardente
de
pântanos quentes, cachoeiras volumosas
homens
sem roupas que amam as árvores
rios
que desejam ardentemente o mar
esse
que reina soberano sobre a Terra
e
que carregamos no DNA
casa
de mamíferos libertos e seres
indecentemente
coloridos
que
mexe, revira, faz onda
e
entra pelo nosso corpo
temperando
nossa casca sensível carregada de pêlos
lambendo
nossos pés na aspereza da areia
que tanto deseja nossos pés
estes
que caminham
que
já pequenos caminhavam
e
lá dançavam com a sensualidade primeira dos humanos
e
os devires sensuais todos do universo carregados em um só corpo
do
verme, da lama, da folha, do bicho, da seiva, do rizoma,
da
luz que cai atrás da montanha
livres
eternos
primitivos
atemporais
quando
corpo era mente
e
mente era desejo do corpo
e
não havia o que pudesse ser negado
quando
se tratava de alegria
naquele
tempo sem tempo
a
Terra celebrava a incrível simbiose de suas criações
e
chorar não era venenoso para ela
tempo
sem tempo que vive dentro de mim
onde,
liberta da dor, posso estar sem necessidade de ar
sensualidade
do tempo
esse,
que nos seduz para o seu jogo
e
torna tudo uma grande aventura dos sentidos
meditação
sensória
nem
apego, nem renúncia
corpo
inteiro, sutil, físico, desejoso
um e diverso