Atonal

sei lá que tipo de matéria eu quereria ser agora
sei que assim, compactada como um corpo humano,
não dou conta nesta hora

queria era estar decomposta
talvez em poeira estelar
em células mortas
infinitamente dividida
em minúsculos grãos de areia ao vento
que se espalhariam e não restaria nada
que pudesse dizer: veja, aquilo tem identidade

nenhum sólido
nenhum corpo
nenhum sentido exposto
nada que conte história

sem passado
sem futuro
só o presente sobreposto nele mesmo
sem desejo
mas com devir
sem afeto
mas com instinto
sem amor
apenas existindo

arrastada pelas tempestades
sem controle
destituída de toda saudade
desmembrada das cláusulas
que um dia o meu corpo assinou

descentrada
e só

diluída na partitura da dor

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