As quatro estações cariocas
A Primavera
Chegada é a Primavera
Se uirapuru ou sabiá que a saúda, que importa
Correntezas aninham-se aos ventos que celebram pássaros
E as águas correm aliviando o doce calor carioca
Uma tempestade se anuncia no horizonte marítimo
Trovões levantam as ondas e alegram meninos
Ao seu fim, retornam as andorinhas ao Arpoador
E distribuem hipnóticos cantos sob o céu azul
Neste cenário de luz entre o mar e o bairro alto
Ao balançar das árvores e às buzinas de carro
Dorme o mendigo com um buquê de flores e o seu cão ao lado
Do pastoral subúrbio ao centro festejante
Dançaria Vivaldi um samba ao seu próprio furor e abrigo amado
Da primavera, cuja aparência de quase verão é brilhante e austera
O verão
Sob a dura estação pelo sol incendiada
Lânguidos homem e cachorro, arde o meio dia
Libertam as maritacas seu canto estridente
Cantores correm para os teatros à refrescar a poesia
Um doce vento norte se vai, e uma disputa
É improvisada pelo sudoeste das viradas na praia
E lamenta o marujo, porque sabe
Teme a feroz tempestade e é seu destino enfrentá-la
Toma dos pobres , após a lida, o repouso
O temor de alagamentos e trovões
E, de repente, inicia-se o tumulto furioso
Temor este, verdadeiro, que fulmina um céu vermelho
E um vendaval, a controverso modo, expulsa o suor dos dourados corpos
Que ora chove e assusta, que ora é o sol a pino que expulsa
O outono
Celebram os cariocas, com danças e cantos,
O grande prazer de um clima mais ameno
Entorpecidos ainda pela cerveja
Encerram as noites em bares sob a lua cheia
E ao fim dos carnavais e do sol estendido
O clima de outono é aprazível
E a estação convida a todos
A gozar um sono auspicioso
Mas o trabalhador, na nova manhã, sai à lida
Com ferramentas, gravatas, corre ao metrô, que irrompe
E foge do calor, da navalha, fogem dele as suas madrugadas
Exausto e em busca de um grande amor
Por dias e noites de cansaço e ameaças
Seu corpo pede calma, seu coração, oprimido, pede alma
O Inverno
Agitado tremor traz o dia cinza
Ao alegre sussurrar de tempos mais gélidos
Sacamos nossos casacos e echarpes
Batemos os dentes para lembrar que é inverno
Subir a serra e acender lareira
Enquanto lá fora a chuva fina traz neblina
Caminhar sobre o asfalto molhado a passos lentos
Gozando cada momento de frio parco, com medo de deixá-lo
Imaginamos gelo, abrimos vinho, namoramos no edredom
Há melancolia também em nossos corações
Que buscam a poesia no cintilar do orvalho da manhã
Sentimos, ao abrir a porta, arrepiar os pêlos
Ventos invadem os desejos por todos os lados
Cariocas também gostam de dias nublados
Uma releitura carioca dos sonetos de Antonio Vivaldi