Poema herança 1
uma música que me lembra o futuro
é esta que ouço agora
não menos carregada de genética
"céu da Mouraria, ouve...
vai chegar o dia novo!"
e me traz aquelas lembranças das mesas postas para o domingo
no gramado, ao lado das árvores,
onde se sentam todos os desejos ao sol
as crianças correm até brincar de cair no mar
do arquipélago distante de onde veio parte de mim
vem uma música cravejada do sonho dos mundos além-mar
lá onde nasceu o desbravador Sr. Vieira Cristo
para quem muito bem poderia ter sido escrito
que tudo vale a pena se a alma não é pequena
talvez sim, ele tenha sido homem de garra
que do mar não teve medo
e foi guiado pela mulher de profundos olhos castanhos e guerreiros
talvez deles tenha eu herdado essa vontade incontrolável
de ser capitã de um maestro dos mares
porque meu barco já tem nome, caro avô
e o sabor que sinto em minha boca
é de azeite fresco que escorre como se não tivesse fim
pedindo de acompanhamento o vinho que esquenta
os momentos de paixão
eu sei, esse violão, essa poesia
trazem toda aquela alegria molhada
de maresia corroendo o ferro
que me faz desejar ser aquele pirata
para quem a pátria é onde o vento passa
esse cheiro dos Açores
atravessou tantas gerações e veio reviver em mim
me fez tecelã de palavras de melancolia e amor
e do meu corpo a eterna casa daquela palavra...
a mais bela e triste que poderíamos
herdar de tanto sangue
saudade
sempre ela
que tão bem revela o que nasci para sentir
então eu, maruja
viajante solitária das estrelas
que só deseja tudo
e só espera viver no instante do entusiasmo
me curvo
ao fogo que arde e me leva longe
onde pássaros ainda desconhecidos fazem sua morada
nas ilhas de fogo
e nas calmas praias necessárias
todos esses lugares
todo o mundo
cheios, todos eles,
dela
a saudade