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A calma do mundo

uma praia eu, você, o mar, todos nós sol até se pôr chuvinha fina no cair da noite café, biscoito doce rede para embalar os sonhos sonhos para se tornarem reais guitarras, pianos, enganos deixados de lado cachorro dormindo, bem-te-vi no telhado planta despertando com a água água para diluir as dores calma para as batalhas do mundo lua, estrela, eternidade em um segundo energia para as manhãs suco de frutas, capim limão e pães castanha para ter crocância bicicleta para a consciência e a errância amor em cada canto da casa no jardim e no banheiro, flores prancha na varanda desejando onda menino na onda realizando a prancha música para um fim de tarde cigarras, incenso, vela de canela cervejinha para brindar com amigos yôga para brindar o corpo sexo com suor e de verdade chinelo pra descansar a ansiedade hortelã, alecrim, manjericão banana com mel, mel com limão livros nas escadas abrindo caminhos uma montanha vista da janela

o que houve?

saudade estranha do que não foi da poesia que ficou suspensa angústia das escolhas mal feitas que permaneceram escolhas e não foram alegrias transbordamentos o que se faz com eles? o que se faz com a poesia diante do concreto?

visão

Mora onde a santidade? Essa que não tem rosto De uma santa que brilha por cima Dos templos tão outros dos antigos Que já não sei para que existem Santa? Demônio? Tanto faz São a mesma coisa O que nos faz tão diferentes? O que nos faz tão iguais? Porque o silêncio e a luz insistem em representar a divindade? Eu poderia ser qualquer santo Entidade, arquétipo Que eu saiba não há graduação pra isso Que eu saiba ainda não inventaram distintivo Que marque a chegada do divino Porque ele está em toda parte Até no que chamam de pecado Minha intuição cada vez falha menos Nunca falhou E quase não dei atenção Porque de fato eu funciono como um alerta E me surpreendo sempre porque acerto Eu sei, sempre sei A santa me falou Me disse que ali era só eu mesma e nada mais Ela foi o sinal Mas quem no nosso mundo tão precário Sabe ouvir o que não se escuta? Eu? Estou aprendendo. Eu ouvi

Eu sou o universo

Não serei o que quer que você queira que eu seja Não posso Acredite que o que se passa aqui dentro Não é o que você vê Você que não me conhece bem E acha cabível conceber um mundo para mim Eu concebo o meu mundo E cada vez mais Nele só cabe o que manda o meu desejo E você vai achar bonitinho o que eu escrevo Profundo... E nem vai perceber que é pra você que eu falo Para todos vocês que constroem Sobre mim teorias e verdades Eu busco sensibilidade Estou à cata das evidências do amor-mundo É isso que me move E se eu esboço uma única palavra que seja Sobre isto, o que escuto é uma risada Ok! Tudo bem... Eu vou continuar fazendo o que quero E você vai continuar acreditando Que me conquistou para sua seita Eu não universalizo Eu sou o universo

em clima contracultural

sabemos que quando o que parece, não parece nada é porque é tudo e deseja o tudo mas é preciso cautela para o nada vir a ser tudo do parecer ao barro o ruído pode ser insuportável ah, mas isso sim é que seria primavera a floração do tudo a partir do nada a agressão da beleza a chocar os escarros dos burocratas vida sempre como potência não à cultura pequena das convenções que importa ela, essa de quem só faz muros lembremos da arte arte é luz e sempre pode nos recordar que o possível pode ser o que quisermos que ele seja que é preciso dizer o que deve ser dito e fazer o que é necessário que seja feito ignorar? esqueça. ideia errada, sinto lhe dizer... o que você ignora se torna um fantasma o que você deseja se torna seu barco e é preciso que deixemos de lado a poesia óbvia e o estabelecido dia a dia copiado. porque também é preciso que sejamos mais e tudo aquilo que a vida pode ser em nós potência é uma questão de coragem.

pop poesia

o pop nunca poupou ninguém cansamos de decorar a máxima a filosofia pop não poupou os ícones a pop poesia é padrão do artista contemporâneo a arte que vive na fronteira é a arte que queremos o artista-acadêmico-errante, nem lá nem cá desterritorialização da especialidade performance do caos urbano estar nas fronteiras provocar a própria criação não se pode ser artista sendo um só o múltiplo pode configurar a arte o pop é possibilidade da recriação da criação do abalo de todos os cânones que sejam belos, que sejam sublimes, que sejam amados mas que deixem de ser cânones abalo sísmico do símio produzindo fogo 2001 chances de acontecer diferente ruir ruir ruir ruídos de todo e qualquer juiz voar pra onde se deve voar para onde está apontado o devir quem cisca é galinha quem voa é águia visão de latitude e longitude não-óbvia produzir com o suor deixar a poesia vir do fígado fazer música com o mesmo torpor de quando se vê o próprio

vontade

desejo é sempre a mesma coisa um dia vai, um dia volta... volta e volta ouvia vovó dizer que vontade é uma coisa que dá e passa não sabia o que vovó queria dizer e então entendi que sim, passa depois que a gente curte aquilo que desejou se passa sozinha? não, só dorme vontade é coisa que dá simples, como laranja o ano inteiro

espera

é sempre muito bom pegar os cadernos depois de um tempo. passo a gostar do que escrevi. de toda forma o que desejo é que ao abrir os olhos pela manhã tenha somente passado um dia mesmo e que eu possa ter a certeza de que há tanto o que viver ainda e que lento, passa o tempo de toda forma é só isso ---- basta que se apague a luz e perdemos um pouco daquela confortável conexão com o fora ficamos dentro grande oceano de nós mesmos difícil é respirar quando somos rarefeitos ---- saudade de tudo aquilo que não sei e quero... ---- um, dois, seis hoje eu quereria tantos outros quanto fossem possíveis quereria ter a certeza de que se pode ir até a lua e não envelhecer tão rápido só flutuar e olhar para o planeta azul de longe e tanto quanto fosse possível eu quereria errar para ter segundas chances elas são sempre um gozo sem fim e subir bem lá no alto daquela montanha na terça de carnaval ver a cidade de longe sent

ressonâncias

Imagem
Existe um deserto em cada um de nós Cada vez mais eu o desejo Na busca de entender o que não entendo? Para ouvir o que nunca escuto? Sei pouco ou nada do que faz com que eu me mova assim Tão avidamente em direção a esse espaço cheio de vazio Ainda não sei Perco tempos preciosos com tal capricho E sou aquela voz que cala após ouvir a própria voz ressoar De alguma forma reverencio esse deserto Que se amplia nas águas, pedras, areia, Nos espinhos e seres que rastejam ou tem guelras Mas o deserto do corpo, esse é o mais intenso Porque só se tem o próprio corpo E ele é o nosso grande deserto Quero me iluminar e deslizar por ele Talvez por isso, por querer Devo parar de desejar? Mas, para quê? Para encontrar a tão esperada calma diante do mundo? Os dias continuam passando O mundo ansiosamente me aguarda e pede reação E não há calma possível diante do mu

perdidos achados

poemas encontrados perdidos em um caderno. chegam aqui da forma como foram achados, sem lapidação, sem cuidado, frescos como quando vieram ao mundo. A vida, que sempre me pareceu curta De repente hoje me pareceu tanto... Imaginar que chegarei aos 50, 60, 79 anos São mais 20 ou 30 Mais 40 ou 50 anos? Posso fazer o que eu quiser! Quanto mais tenho que esperar? Trabalhar? Para quê? Queria estar sempre no topo do mundo, no alto das montanhas Os Andes, o Himalaia E descer todos os mares Experimentar todas as especiarias Os sabores das frutas e das folhas Os molhos, as ervas, os cremes Beber todos os vinhos Sentir o cheiro do incenso na Índia e no Nepal Curtir o mar do meio do oceano Ouvir a maravilha da gravidade dos sons dos sinos budistas Correr por castelos, e me integrar nas primaveras doces dos rios todos Para que tanta política e ciência Se o que quero é sentir o mundo? Se assim sou feliz, Apenas sentindo... Para que precisamos de p

poema-oceano

o mar sob meu teto todo dia sinto o cheiro janela aberta é condição a onda sempre vai e volta mas meu barco faz porto de qualquer lugar que se apaixone fica, e deixa que vá e volte só a onda mas se volta, depende fato é que ele vai o mar sob meu sonho... meu barco já está no mundo apenas eu que ainda não cheguei

poema-jardinagem

Imagem
queria hoje uma chuva de flores a cair sobre meu corpo retirar-lhe o peso e transformar-lhe em flor eu o queria inteiro, esse corpo cansado, sem chão para oferecer-lhe cheiro de alfazema no pé, cor de rosa, violeta, orquídea preta senti-lo pétala a pétala como se fosse gérbera vermelha queria hoje ser um lírio aposentado, um girassol abandonado, a compartilhar com ervas daninhas o gozo de brotar de qualquer jeito ser um corpo leve e sair por aí como dama da noite que não pede desculpas ao entrar sem bater um frangipani enlouquecido! corpo sem culpa, eu brotaria dente de leão, flor que voa, e voaria para sempre até que me esvaísse quando então eu já seria uma lótus universal conectando o espaço sem fim de todos os corpos morando sob suas cabeças os ajudando a brotar e voar queria hoje só brotar e voar e

poesia para a vida

o brilho dos olhos... vai embora como cachorro desprezado se a gente não cuida de manter as paixões -------- de repente um dia você acorda e o mundo começa a existir mas aí já é tarde e só te resta aposentar o corpo morre antes guri, pra não ver que perdeu a vida ou trate de viver agora que o sonho já está logo ali quando você virar a esquina, ele acenará -------- a alegria se inscreve por si mesma portanto, procurá-la, é passatempo das fraquezas é ela quem vem de encontro não se acha na gaveta, nem na mala, nem num canto quem espalhou que a dúvida é benefício é porque cedeu a mão ao medo e esqueceu que a alegria não duvida medo de ir exatamente onde se deve ir - e exato não é preciso mesmo que esse onde deixe de ser depois aquele onde de agora - que é somente um onde do instante, para se tornar o que já foi e não é mais há coisas que não podem prolongar-se pois não há prolongamento possível àquilo para o qual já é ne

Mauá

tenho em mim uma cicatriz da Maromba com que me presenteou o Escorrega acima da flor de lótus residirá eterna como a tatuagem a alegria de repente ganha forma no meu corpo porque aquele lugar também é meu corpo e meu corpo é a pedra e o rio Preto meu sangue correu por ele, já deve ter chegado ao mar faz tempo meu sangue e o mar são agora um assim também meu corpo, toda Mauá, o rio, as pedras, a mata, os entes, as estrelas somos todos um único corpo modos da substância tão bela quanto mais indiferente consigo concebê-la e a flor residirá a expelir a cicatriz para sempre enquanto meu corpo resistir a entrega final e meu sangue estará lá, no rio, no mar, na chuva que cairá após os dias quentes de sol para voltar à terra e fazê-la mãe de uma árvore frutífera

oops

já acordo em sobressaltos meus múltiplos fluxos não deixam barato vapor reagir pra quê? melhor é ir de mãos dadas parar de forma alguma ligar a TV jamais usá-la como móvel para suportar flores e um gnomo palavras, projetos starta tudo ao mesmo tempo a vida escorre como aventura perigosa que dá fome e faz neblina e quando tudo se aquieta medito e alongo o corpo desejoso paro sem parar paro sem estagnar o olhar paro para não ouvir as vozes rabugentas e os pensamentos secretos do âncora do jornal pego a vassoura e o enxoto como bicho que não se quer músicas, só as que desejo aquelas músicas! sons? do vento, das vozes amigas, do pensamento que persiste calor? dos corpos, do sol e da arte o das luzes artificiais que fique para os cegos água pra todos os lados para lavar com os meus santos os alheios velas para criar penumbra, incensos para remeter mato, muito mato, e chuva fina no telhado bora correr na rua? pintar o hidrante e fazer

novos fragmentos

há poetas que só falam do povo outros que só falam de si mesmos os que falam do povo argumentam que a verdade do artista está em ser a voz do povo os que falam de si mesmos argumentam que a verdade está em ouvir a voz interior mas desconfio que cada um de nós é o universo inteiro e todas as verdades e que falar do povo é sempre falar de si mesmo --- deixei abertas todas as janelas que importa a poeira? me importa o vento poeira faz parte do vento

raro

raro, não se decomponha em dor escape pela criação sua força reside no suor e na palavra em um amor imenso que talvez nem consiga ver amor-território lembre-se do território fuja, mas retorne diferente grande, esbelto, esguio, prazeroso porque só há prazer em você saliva, corpo inteiro, sentidos, há mais do que te fizeram crer há o que você já sabe vá, corra dance respire alongue o mundo é seu todo seu e o amor é fácil nisso que esboça naquilo que permite até mesmo no que ainda não sabe está no corpo é um calor sentido é um desejo inevitável é vida,   vida que pulsa nas veias no nervo, nos cabelos, nas pernas que encontro no peito carregado de pulsações vida que cresce e quer tomar forma vida que grita e quer nada além do que ela mesma em você

palavras e coisas

algumas palavras não mais compõem meu vocabulário não sou literata, sou poeta e poeta não precisa da linguagem-objeto as palavras me são as coisas voltei no tempo para me transformar em mago se me prendem, definho meu coraçãozinho livre sofre e se esvai a força não antes, claro, de rir muito alto e produzir afetos que lhe parecerão insuportáveis se me obrigo, morro mas me dê sal, ervas, um tambor e chocolate e faço o universo cate comigo conchas no fundo do mar e me entrego me conte desejos e projetos e derreto toda afinal, sou poeta porque digo que sou assim como apenas simone e sartre poderiam dizer que eram um casal quero cada vez mais os elementos e o sentido da vida que vá para o inferno já achei o meu a astrologia me é tão séria quanto sua ciência amo a música e as imagens com a mesma intensidade e minha religião é feita de terra, sangue e maresia no meu panteão, cristo é irmão de dionísio e pouco me importa o que você pensa que

eu, o que é e se desfaz

a vida é uma brincadeira, definitivamente e, de fato, é só isso que posso encontrar de definitivo no mais, tudo o que tomamos como necessário necessita de tanto peso e solenidade que me faz bocejar não é possível aos presentes ouvir um professor que exale poesia em aula de administração muito menos ao moço de sapatos marrom que mesmo no elevador parece correr pelas ruas da cidade carrega uma pasta preta, sei bem o que tem lá dentro dor, dúvida, um coração aflito e um macho ressentido mais cedo presenciei apatias vi aqueles que lêem fernando como bula de remédio incapazes de rir do pão de queijo que cai aos seus pés como se fosse a cabeça de um cogumelo rolando repreenderam o riso desinibido que o poeta compartilharia conosco ao ler suas próprias palavras mas quem sou, ora pois, para sair por aí dizendo tudo isso? eu que nasci sob o mesmo signo, mas cujos heterônimos não me tenho claros? de qualquer forma, que interessa! eu, aquilo que sente, pode

A saída para o mar

Eu sei, ainda que não a veja Ela está sempre lá Na direção da janela do meu quarto A saída para o mar aberto que amplia esta baía Onde uma fortaleza já perdeu o seu sentido E não é nada mais agora que uma bela obra de arte Como se tornam todas as obras de arte com o tempo Puro vazio... Sangue que ficou num lugar desconhecido Mais bela quando o mar se agita E em sua muralha as ondas quebram indiferentes De lá de cima posso vê-la melhor Conversam as obras artísticas A de onde estou, utopia de arquiteto E a que te abriga aí embaixo, no mar O passado e o presente em conversa Tecendo um futuro já tão próximo Que posso sentir o seu cheiro Ele entra sempre pela minha janela O vento é sua carruagem Naquelas noites calmas Em que os ônibus dão trégua de fazer passagem E não há adolescentes a gritar no pátio Só a luz do museu encoberta por uma neblina clara E a minha velha conhecida inquietação Nem mesmo as paredes tão sufocantes

Declaração

não há nada mais belo e perigoso que desejar ser o profeta de sua própria história e eu, que recebi tal dedicatória no filme que me arrebatou, se não me faltassem palavras agora, já tão bem ditas no livro, como quem mede mas não pesa, nem o poder da intensa criação sonora, arcaica e renovada, aquela fome toda dos corpos da família, e o súbito olhar de Ana, escapando à captura, a dança de Shiva, se não faltasse agora... seria eu a própria potência, a estrela renascida, barro de novos constructos, rizoma de tudo o que respira aquilo que te sobra, amigo a força de afirmar a vida dure o tempo que tiver que durar desde que talhada no amor impessoal ela, a vida, pois que é o contrário da morte, o amor e o que dá a isso que chamamos vida a sua consistência eu poderia sair por aí simplesmente a colher as pitayas todas do universo como criança coiote, a ser também uma entidade, o mago, a força, a mãe, o louco, o it não fossem ainda fo

poesia abelhuda

desconfio que é preciso brincar e dançar recorto minha vida, faço mosaicos pinto de vermelho o que era branco e algo me tenta a descolorir os verdes, azuis, as cores de fruta, o inexistente para deixá-los mostrar novas cores não gostaria de ser mais do que uma abelha e polinizar
vago é o meu espaço uma rima pobre com teu nome ele deixa brechas pois, do contrário, não escaparia me calo e me despeço sou o meio o que não quer ter nome sou o que deseja tirar as palavras de quem ao dizer, dirias nada é preferível que não falem é preferível que não vivam a viver pela metade melodia desastrosa essa que sai de mim sou interferência calo

receita encontrada num papelote azul em fevereiro

amar o tempo gostar das passagens libertar-se nos finais gosto quando acaba o carnaval!

tão perto

o horizonte nunca sai do lugar para amá-lo é preciso não ser

escrevo

escrevo como quem de repente acha graça e ri como a onda que cresce com a mudança do vento e a excitação do momento primeiro mas, sobretudo, escrevo com a paixão pelas imensidões o que é pequeno me adoece como ostra, fixo no fundo até que a correnteza me dê pistas para onde ir e sempre vou, em direção àquilo que não posso medir sou peixe, ave, veleiro nado longas distâncias vôo e deslizo se há janelas, mantenho-as abertas se há um pôr do sol, morro de amor se há altura, deliro se há o mar, é lá que estou