O amor em tempos de metamorfose
que solidão maior pode haver
que a do sentimento imponderável
cujas palavras tentam dizer
e se atrapalham
cujo olhar talvez diga
mas não tenha tanto tempo
cujo sorriso e suor revelam
mas cujo silêncio é necessário
que solidão maior a de um sentimento
que é, ao mesmo tempo,
desejo de pele e um respeito que o preze
admiração, cuidado, distância
tesão, desmedida do afeto, errância
capaz do mais profundo entendimento
e até do esquecimento – para renovar-se
à luz do qual eu seria capaz
de loucuras desvairadas
como me deixar solta ao vento
para ser carregada por tais mãos
que me arrepiam
e os olhos que me saltam com brio
solidão do corpo na madrugada, assustado
acordado por sonhos sucessivos
em noites alternadas
por mãos, janelas, quartos
no escuro que revela
as vozes que escuto não sei de onde
as visões que chegam sem bater na porta
saltando em minha aorta a respiração pesada
da certeza de algo que me revela mais
do que a estrada passada
um sentimento que não basta ser doado
que, cheio de si e de sutis e longas doses,
me torna incapaz de compreensão
nestes tempos de metamorfose
é tão meu este império de sentidos inexatos
que de fato, guardo em mim, o seu cenário mais delirante
amar é mesmo um deserto
mas há que se resguardar do sol escaldante